Como o exercício afeta o sistema imunológico?
Nos últimos anos, ficou claro que a prática regular de exercícios físicos tem um impacto profundo no nosso sistema imunológico. Mas os efeitos variam muito dependendo da intensidade, duração e tipo de atividade.
De acordo com Nieman & Wentz (2019), exercícios com menos de 60 minutos de duração e intensidade moderada a vigorosa melhoram a vigilância imunitária, promovendo a recirculação de células imunitárias altamente ativas, como linfócitos T citotóxicos e células NK. Pelo contrário, esforços prolongados e extenuantes estão associados a disfunção imunitária transitória, stress oxidativo e inflamação.
Exercício moderado: o melhor amigo da imunidade
Quando você se exercita de forma moderada – como uma caminhada rápida, natação leve ou pedalada sem exageros – seu corpo responde com um reforço na imunidade. Isso acontece porque:
- Aumenta a produção de células NK (Natural Killers), que combatem vírus e tumores.
- Estimula a resposta Th1, que protege contra infecções intracelulares (como gripes e resfriados).
- Melhora a função de macrófagos e células dendríticas, que são essenciais para detectar e destruir invasores.
Estudos mostram que idosos que praticam exercícios moderados têm mais linfócitos T (células de defesa) e produzem mais interferon-gama (IFN-γ), uma molécula antiviral. Ou seja, movimentar-se ajuda a evitar doenças!
Exercício intenso: cuidado com o excesso
Agora, se você é daqueles que adora maratonas, treinos pesados, ou sessões exaustivas no ginásio, saiba que o efeito no sistema imunológico pode ser diferente. Exercícios muito pesados e prolongados:
- Reduzem temporariamente a função dos neutrófilos (células que atacam bactérias), deixando o corpo mais vulnerável por algumas horas.
- Aumentam citocinas anti-inflamatórias (IL-10 e IL-1ra), o que é bom para reduzir danos musculares, mas pode enfraquecer a defesa contra vírus e bactérias.
- Podem induzir apoptose (morte) de linfócitos, especialmente se não houver descanso adequado.
Isso explica por que atletas de elite, como maratonistas, ficam mais propensos a infecções respiratórias após competições.
O papel das citocinas: mensageiras do corpo
Você já ouviu falar em IL-6? Ela é uma citocina liberada pelos músculos durante exercícios prolongados e tem um papel duplo:
- No fígado: ajuda a produzir energia (gliconeogénese).
- No músculo: melhora a captação de glicose e queima de gordura.
- No sistema imune: pode ser tanto pró-inflamatória (ativando defesas) quanto anti-inflamatória (evitando danos excessivos).
Além dela, a IL-15 (importante para o crescimento muscular) e a IL-8 (que ajuda na recuperação) também são liberadas durante a atividade física.
Relação entre exercício e risco de infeções
Estudos epidemiológicos mostram que atletas de elite submetidos a cargas intensas de treino têm maior risco de infeções do trato respiratório superior (ITRS). Por exemplo, maratonistas têm um risco 2 a 6 vezes maior de ITRS na semana seguinte à prova. No entanto, a prática regular de exercício moderado está associada a uma redução de 40–50% nos dias de sintomas de ITRS, conforme demonstrado em ensaios clínicos randomizados. Este efeito protetor é superior ao de muitos medicamentos e suplementos.
Efeito anti-inflamatório do exercício crónico
Pessoas fisicamente ativas apresentam níveis mais baixos de marcadores de inflamação crónica, como a proteína C-reativa (PCR) e a IL-6. Este efeito é particularmente relevante na prevenção de doenças crónicas como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e certos tipos de cancro.
Exercício e cancro da mama: um aliado na prevenção e recuperação
Um estudo recente reforça que a prática regular de exercício físico pode ser uma arma poderosa contra o cancro da mama. A atividade moderada não só ajuda a reduzir o risco de desenvolver a doença, como também melhora a qualidade de vida durante e após o tratamento.
Exercício e imunossenescência
O envelhecimento está associado a um declínio na função imunitária, conhecido como imunossenescência. Estudos mostram que idosos fisicamente ativos apresentam:
- Melhor resposta à vacinação da gripe;
- Menor inflamação basal;
- Maior atividade de células NK;
- Telómeros mais longos nos leucócitos.
Como funciona?
- Redução da inflamação crónica: O exercício equilibra citocinas pró e anti-inflamatórias, criando um ambiente menos favorável ao crescimento de células cancerígenas.
- Controlo hormonal: Atividades como caminhada rápida ou natação ajudam a regular os níveis de estrogénio, associados a alguns tipos de cancro da mama.
- Fortalecimento imunitário: As células NK (Natural Killers), ativadas pelo exercício, são capazes de identificar e destruir células anormais.
Recomendações práticas
- 30 a 45 minutos/dia de atividade moderada, 3 a 5 vezes por semana (ex.: caminhada, ciclismo, ioga) já fazem diferença.
- Evitar o sedentarismo: Mesmo pequenas pausas para alongar durante o dia contam.
- Evite exageros: Sessões muito longas ou intensas podem baixar as defesas temporariamente.
Nota importante: Consulte sempre o seu médico antes de iniciar um novo plano de exercícios, especialmente durante tratamentos.
O que isso significa para si?
Se o seu objetivo é fortalecer a imunidade, o ideal é:
- Praticar exercícios moderados regularmente (caminhada, ciclismo leve, natação).
- Evitar sessões muito longas e exaustivas sem preparo adequado.
- Descansar bem entre os treinos para evitar sobrecarga no sistema imune.
Conclusão
O exercício físico é um aliado poderoso da saúde, mas como tudo na vida, o equilíbrio é essencial. Se você se movimenta na dose certa, o seu sistema imunológico agradece. Mas se exagera sem descanso, pode ter o efeito contrário. Recupere bem: sono, nutrição e hidratação são essenciais para apoiar o sistema imunitário após o exercício.
Referência científica
- Terra, R. et al. (2012). Efeito do Exercício no Sistema Imune: Resposta, Adaptação e Sinalização Celular. Rev Bras Med Esporte, 18(3), 208–214.
- Nieman, D. C., & Wentz, L. M. (2019). The compelling link between physical activity and the body’s defense system. Journal of Sport and Health Science, 8(3), 201–217.
- Pedersen, B. K., & Hoffman-Goetz, L. (2000). Exercise and the immune system: Regulation, integration, and adaptation. Physiological Reviews, 80(3), 1055–1081.
- Simpson, R. J., et al. (2020). Exercise and the regulation of immune functions. Progress in Molecular Biology and Translational Science, 135, 355–380.
- Benefits of Exercise in Breast Cancer. Arq Bras Cardiol. 2022 Dec;119(6):981-990. English, Portuguese. doi: 10.36660/abc.20220086. PMID: 36541995; PMCID: PMC9814800.
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